Revista Fragmentos
  • Início
  • A Revista
  • Colunas
  • Contato
Imagem do campus da Praia Vermelha (Fonte: Agência Brasil)

Rafi e Jéssica se encontram em uma chamada de meet, como tem sido a maior parte de nossos encontros até aqui. Garantem que conseguem se escutar e Rafi apresenta um pouco do projeto da Revista Fragmentos, começando a entrevista:

Rafi: A gente está conversando com alguns estudantes para entender a demanda mais urgente desse momento da pandemia. Você, por exemplo, que está cursando o PLE, como tem sido essa experiência? Como é que está sendo esse contato com a universidade à distância? O que você sente em relação às trocas nos corredores que não acontecem mais? Aos encontros virtuais? E como você acha que poderia ser uma saída para esse contato com os outros estudantes que a gente não está vendo mais nos corredores?

Jéssica Peixoto: É pra eu falar tudo isso aí de uma vez só? (Risos) 

Particularmente tá sendo - inclusive estou fumando cigarro, tabaco, porque assim, é um escape. A gente tem que escapar para algum lugar. Tem sido um pouco difícil para mim, porque eu tenho questões com horários de dormir e acordar e sem pensar que vou encontrar meus amigos lá ou esbarrar com a galera para tomar um café, vou atender meus pacientes, sabe? Eu não estou tendo isso. Então tem sido complicado. Eu acho que a questão do movimento de você ir para algum lugar te dá um impulso.

Apesar de eu ter, isso aí é uma outra história, eu tenho fibromialgia então assim, a PLE é boa por um lado, porque eu não preciso às vezes andar para faculdade, às vezes estou sem passagem ou então eu quero economizar dinheiro, vou andando. Por um lado é bom porque às vezes eu voltava andando e eu chegava em casa morta, sabe? Com dor no corpo, cansada, por causa do negócio da fibro.

Mas, então tem sido assim. Tá sendo difícil acompanhar. E não é uma coisa que eu vi só a partir de mim, outras pessoas estão relatando que estava difícil e ainda tá. Tem gente que tá na mesma coisa que eu, que agora tá conseguindo correr atrás das coisas. Então assim, por um lado eu fico até, me sinto... como se não fosse só eu, tem outras pessoas que estão na mesma que a minha. Então o problema não é comigo, é para além disso.

E é uma dificuldade, me lembro no início, antes da PLE, muita gente falando que não estava conseguindo dormir, que estava dormindo tarde pra caramba . E isso era uma problemática que eu vi que não era só minha coisa, era uma coisa geral.

E tá sendo difícil por um lado porque alguns professores parece que demandam, parece que como se a gente tivesse em casa e tivesse 24 horas do dia pra fazer isso. A problemática do home office. A minha mãe trabalha de home office e às vezes fora do horário eu pegava ela vendo e-mail. A gente viajando e minha mãe com um computador lá, uma hora vendo e-mail, respondendo e-mail. É a problemática do home office.

E assim, falta de noção de alguns professores em relação ao conteúdo, em relação a como esses alunos estão. Alunos que tão fora de um lugar. Tudo bem que a gente fala que a faculdade é um lugar desconfortável, que a faculdade tem mil problemas. Mas eu sinto como se ali fosse minha segunda casa, sabe? Eu adoro aquele espaço que é arborizado. Eu pego um fresquinho que às vezes vem da praia. É um lugar diferente do que se a gente vai ter aula no fundão. Então, assim, eu gosto muito, a gente gosta do DCE, a gente gosta do espaço. Então, é como se tirassem esse lugar, esse nosso lugar, essa nossa instituição. 

E aí eu vou aproveitando que falamos sobre o PLE, colocando sobre uma matéria em particular em que eu vou. Não sei se isso seria problemático colocar diretamente, mas aí depois faz a edição se for preciso.


Rafi: Não trabalhamos com censura. (risos)

Jéssica Peixoto: Então tudo bem. 

Jéssica apresenta queixas em relação à disciplina de estatística, que se transformam em críticas a disciplinas como fisiologia I e histologia, e a dificuldade de certos professores em dar conteúdos que façam sentido para estudantes de psicologia. Demandando que isso se transformasse em uma conversa. A partir de uma intervenção de Rafi sobre a COAA, a conversa se movimenta em direção à saúde mental dos estudantes do instituto.


Jéssica Peixoto: Tem alguns professores que eu vejo que tem esse movimento de cuidado. Por exemplo, a Fernanda Paveltchuk e o Rafael Lins. Eles pensaram em atividades assíncronas, houve o entendimento de fazer um negócio que fosse mais fácil para todos. Eles estão sempre com esse cuidado, fizeram um formulário para ver quem tinha as tecnologias, como seriam as melhores formas de dar os conteúdos. A Cristal veio falar comigo. Eu falei que não tava fácil e ela veio perguntar “qual é a melhor forma? O que a gente pode fazer? Entra em contato comigo.” Há professores assim lá, não é que todos os professores tenham essa mentalidade não. Mas eu acho que falta isso como uma característica do Instituto de Psicologia, sabe? Uma coisa que venha da coordenação, da direção, pra espalhar pros departamentos.

Rafi: Então, vamos supor uma proposta que venha dos estudantes. No meu caso, da Fragmentos, uma proposta que vem dos estudantes, que um professor acolheu e que foi formatado enquanto projeto de extensão. Então, o que você acha que a gente poderia fazer tanto num ambiente virtual, que a gente está usando o dispositivo do instagram, quanto quando voltarem às aulas, para dar conta dessas demandas que os estudantes têm? 


Jéssica Peixoto: Você já tinha me mandado um pouco essa pergunta antes, né? Então eu acabei pensando, acho que poderia ter uma proposta dos estudantes serem vistos da forma que eles quiserem se colocar. Por exemplo, tô passando por um momento muito difícil. A gente fez um grupo de pessoas, não sei se você ficou sabendo. Um grupo sobre linguagens, sobre poesia, com a Karla. Então, a gente produzia muita coisa, a gente pegava palavras e mudava, e construía e tudo. Só que o que acontece, montar grupos, eu acho uma coisa interessante. Só que uma coisa que a Karla colocou, e foi uma coisa que se deu, é que as pessoas não tão se segurando nisso. As pessoas hoje não estão com cabeça de manter alguma coisa, manter um grupo. Então eu acho que poderia ser a pessoa mandar sem uma constância, mas por exemplo, estou passando por um momento difícil, escrevi um texto aqui sobre esse momento, sabe? E aí mandar e vocês publicarem com autoria ou anonimamente. Ou então, fiz um desenho sobre esse momento que eu to passando e aí uma produção disso. 


Seguem conversando sobre possíveis atividades que envolvem a saúde mental dos estudantes de psicologia.


Jéssica Peixoto: Pegar esse negócio por exemplo de pensar o instituto e a saúde mental do estudante. Uma coisa que eu já cansei de falar sobre, mas aproveitando esse espaço. Qual é o acolhimento que está sendo feito dos alunos que, por exemplo, perderam parentes, amigos, amores? A gente sabe que tem um monte de gente morrendo, a gente sabe que tem um monte de gente internada. Tem um monte de gente sofrendo aí pra caramba e como está sendo esse olhar pra essas pessoas? Essas pessoas estão desamparadas. Quer dizer, há o amparo das pessoas que estão fazendo terapia e tudo, mas como o instituto tá pensando sobre isso? Como essas pessoas podem se expressar em um lugar como a Fragmentos? Abrir também para essas dores. Porque a gente fica com as dores todas aqui assim - faz menção para seu peito - a gente tá dentro de casa, a gente não sai, a gente não esbarra com nossos amigos e pensa, puts, tenho um negócio pra te falar. Então como que você vai fazer pra pegar um amigo seu e dar colo pra ele? De longe? Eu acho que é pensar isso também, é óbvio que a gente tem que pensar em afetos positivos, coisas que vão nos segurar em vida, sabe? Como eu falei, pegar uma música, pegar um filme, que é uma coisa que eu gosto muito de conversar sobre. Trocar uma ideia sobre, sabe? Mas a gente precisa também colocar  as dificuldades, as dores que estão sendo viver num isolamento. 


A gente tem uma quantidade de pessoas que vêm de outros estados. Como está sendo isso? Como está sendo passar esse período inteiro sem poder voltar para casa dos pais? Da família? Estar morando sozinha? Eu, por exemplo, estou morando aqui sozinha. Se eu não tivesse meus dois gatos, eu acho que eu estaria já surtada, sabe? Então assim,eu acho importante essa produção de coisas no sentido positivo, sabe? Trazer esses afetos positivos para trazer essa coisa gostosinha, sabe? De você olhar pra aquilo ali, e hm gostosinho, quero ter pra mim ou quero compartilhar também. Mas também ser um espaço para conversar sobre as dores. As pessoas eu acho que tem vergonha, não sei se é vergonha, não sei se é… eu não sei qual é a construção. Isso é outra coisa, a gente não estuda sobre a tanatologia. Só que a morte, ela faz parte da vida. Quando a gente vai pegar uma pessoa em luto, o que a gente vai dizer para aquela pessoa? E a gente vai pegar uma porrada de pessoa. Pra quem tá atendendo, a gente vai pegar uma porrada de pessoas no processo de luto. Se a gente abrir a grade lá das matérias até tem uma matéria. Só que desde 2011, eu nunca vi essa matéria sendo dada. E é uma coisa que está sendo assim, está sendo uma das coisas importantes, tá sendo uma das coisas marcadas nesse período. E a gente não fala, porque é difícil mesmo falar, sabe? Eu acho que eu até tenho uma certa facilidade de falar sobre isso, mas eu entendo que como um conceito geral é difícil falar sobre.


Jéssica e Rafi conversam sobre como a Revista Fragmentos pode ser um espaço de acolhimento para essas dores.

29 de mês de 2021

Entrevista por Rafi Nobrega
Edição por Adriana Herz Domingues
Psicologia - UFRJ


Sobre autor (a/e):

Rafi é aspirante à Psicólogue, Angoleire e amante das histórias. Tem uma queda por escritos humorados e com boas reflexões. Idealista ao extremo, gosta de decolar nas ideias e projetos para a Revista, mas, sempre com a ajuda da equipe, sabe colocar os pés no chão novamente para a construção de um território possível.
Adriana é estudante de Psicologia, militante feminista e socialista, apaixonada por desenho.

 (Arte: Álan Batista)


Completamente desestruturado pelo furacão sobre quatro rodas chamado Rayssa Leal, peço licença para tentar (ênfase no tentar) falar um pouco sobre esse fenômeno. 

Primeiramente, qualquer coisa que for escrita ou descrita aqui não contempla o fuzuê de sentimentos causados pelo feito da maranhense de 13 anos nas Olimpíadas de Tóquio 2021. 
As Olimpíadas, no geral, já são uma grande concentração de emoções e histórias semi-fantásticas. As Olimpíadas de Tóquio, em meio à pandemia de Covid-19, então, ainda mais. É uma amálgama de sensações ver as superações e a coletividade nesse momento tão desolador. No caso de Rayssa, então, não estou nem falando da sua merecida medalha, e sim de algo ainda mais transformador: sua alegria. 

Particularmente, me preocupo com a supervalorização da alegria em diversos contextos, dando muitas vezes a entender que não haveria espaço para outros sentimentos. Rayssa mostrou que isso é uma baboseira. Sua alegria, sim, era chave para sua concentração. Ela se focava ao máximo quando demonstrava seu estado natural de sorrir e dançar. Mas não era só isso: em momentos, sentiu raiva por errar uma coisa ou outra, sentiu tristeza pelas companheiras de seleção não estarem na final com ela, sentiu nervosismo também, e por aí vai.

Mas não é só isso! Ainda mais no contexto em que vivemos, no mundo e no Brasil, mais do que nunca, ser alegre é uma ousadia – transmiti-la, então, é um gesto revolucionário. Como diz Luiz Antonio Simas, é mais do que uma resistência – atrelada a uma força corrosiva que a pautaria – não! sua alegria foi, e é, pura produção de vida. Acho que o melhor jeito de sintetizar o que os milhões que estavam acordados sentiram é: nos sentimos mais vivos.

"Caramba, é muita coisa em cima de uma criança!" Na verdade, não. (E aqui eu já peço desculpas à Rayssa, pois eu sei que também detestaria ser chamado de criança no auge dos meus 13 anos.) Afinal, em um momento em que um bando de adultos cinzentos por dentro fazem de tudo para tirar as cores do mundo, a alegria pura de uma jovem enquanto compete no maior evento esportivo do mundo, dando o seu melhor, mas sem perder sua "leveza criançal", é absolutamente tudo que se precisa hoje em dia. Muda o mundo. Greta, Malala, Rayssa… os adultos de hoje que se cuidem. Afinal de contas, é muito melhor ver o elefante comido pela cobra do que o chapéu. Nas palavras de Manoel de Barros: "Tenho candor por bobagens. Quando crescer eu vou ser criança." 

E claro que Rayssa não tem dimensão disso tudo. Do que ela inspirará nos corações de todas as milhões de crianças no Brasil – as de pouca e as de muita idade. Do fato de que, assim como a Fórmula 1 de Airton, o Tênis de Guga, o Surf de Ítalo, entre outros, agora o Brasil abraçará o Skate de Rayssa. Quantas crianças (de novo, as de pouca e as de muita idade) não já colocaram um skate em sua lista de compras? Então, sim, ela muito provavelmente não tem dimensão disso tudo – e, sinceramente, ainda bem que não.

Obrigado pelos sorrisos, Rayssa.
Vida longa à criancice.


27 de julho de 2021

Rafael Vasconcellos 

Rafael é carioca, clínico em eterna formação, ex-tenor no “SVAC” e mestrando em psicologia pela UFRJ. Filósofo de botequim e sofredor pelo Botafogo, escreve como hobby para ajudar a respirar. Acredita que na escrita de ficção como uma arma poderosíssima de comunicação que deveria ter mais espaço nos ambientes acadêmicos.

     (Arte: Álan Batista) 

Estava vendo por esses dias vídeos no YouTube, quando recebi uma recomendação do que considero um dos melhores canais no site, “Kurzgesagt in a Nutshell”. O canal alemão, mas narrado em inglês e com legendas em português, consiste em animações bastante visuais que visam simplificar temas sobre as Ciências e a Filosofia, a fim de divulgação de conhecimento. Há vídeos sobre humanidades, exatas, e, nesse caso, biológicas.


Nesse caso, era um vídeo sobre o nosso sistema imunológico. Pensei comigo: “Não perdem uma oportunidade! Falar desse tema em meio a pandemia”. Mas não, era um vídeo de meia década atrás. O acervo de temas não para de me surpreender.


No vídeo, o narrador conta a história da incessante relação de centenas de células e moléculas diferentes na hora de patrulhar, identificar, decidir o melhor enfrentamento e, enfim, combater. A pluralidade de funções desempenhada de forma coletiva pelas diferentes peças nos faz pensar na beleza da vida. Somos muitos, até mesmo a unidade humana é plural dentro de si.


Impossível não invocar também a imagem da vida em comunidade e/ou sociedade enquanto um organismo vivo – num baile entre biologia e sociologia, que faria ambos os seus bacharéis irritadíssimos. Cada um exerce a função em prol de um bem coletivo, que beneficia a todos.


Nesse momento em que se revela cada vez mais claro a força da individualidade, talvez um exercício importante fosse olhar para nós mesmos. 


Eu sei, essa biologia sociológica ou sociologia biológica é um pouco clichê. No entanto, sinto que precisamos resgatar um pouco o clichê e o óbvio nesse momento. Nos lembrar de coisas óbvias, como: a vida é sempre coletiva; toda luta e todo combate, em sua dimensão, é uma história em si; e que não há nada mais potente do que um botão de aleatório em um bom canal de divulgação de conhecimento.



21 de julho de 2021

Rafael Vasconcellos 

Rafael é carioca, clínico em eterna formação, ex-tenor no “SVAC” e mestrando em psicologia pela UFRJ. Filósofo de botequim e sofredor pelo Botafogo, escreve como hobby para ajudar a respirar. Acredita que na escrita de ficção como uma arma poderosíssima de comunicação que deveria ter mais espaço nos ambientes acadêmicos.


 (Arte: Álan Batista)


Assunto sério aqui. Estive pensando nesses últimos dias algo relacionado a nossa expressão. O que você tem feito no seu dia-a-dia para passar o tempo? A quanto tempo você não dança, por exemplo? Pode parecer trivial, mas não vejo bem assim.

Pensei sobre isso ao fim de um dia relativamente leve – eu sei, acalme-se, não precisa ter inveja, pois é raro para mim também. Acontece que nesse dia percebi que ouvi mais música, optei por assistir algo mais leve na hora de almoçar/jantar, e isso sem necessariamente “me alienar” (algo impossível em tempos de rede social).

Essa parte não é especificamente uma novidade para mim, pois desde o início da pandemia eu praticamente parei de escutar música, de assistir série ou filme, ou qualquer coisa nesse sentido. O tempo, ao que parece, tornou-se muito mais utilitarista sem que eu percebesse – talvez por uma urgência criada com o medo trazido pela pandemia. “Não tinha tempo para nada”, seja lá o que isso signifique.

Muito se fala da transformação do lar em ambiente de trabalho nesse momento em que vivemos, mas talvez não seja apenas isso. Saíamos para nos encontrar com amigos ou para ir ao cinema, ouvíamos música no caminho, e nada mais disso existe. Afinal, caminho para onde? Para a cozinha? (Claro que esse texto pensa  naqueles que não tem saído para aglomerar todo fim de semana).

Nessa linha, quando foi a última vez que você dançou? Pergunto isso até àqueles que “não são de dançar” e àqueles que são tanto que dançam até em casa sozinhos. Estendo essa pergunta a qualquer atividade que você se entregue de corpo e alma. Se tornaram mais raros, né? E ficar acompanhando o dia todo as notícias do iminente fim do mundo em que vivemos? Mais ou menos raros?

Como dançar ao som do fim do mundo? Soa mesquinho. Tanta coisa ruim acontecendo, tanta gente morrendo. Como criar ânimo para tal sem se sentir culpado? A canção que toca ao fundo é fúnebre. De todo modo, música ainda é. Se ela der uma animada, nem que seja mínima, dance! O que é canção sem um corpo mexendo, um ouvido hipnotizado, um dedo batucando, uma corda vocal murmurando? Música triste ainda sim é música.

Bem, e na prática, o que fazer? Não sei, acho que ninguém sabe. No entanto, eu, por exemplo, estou aqui falando sobre isso. Tomara que consiga correr atrás das músicas não escutadas, dos filmes não assistidos e das danças não dançadas nesse maldito ano meio que vai passando – não prometo nada. Na torcida, também, que “isso” que vivemos nem chegue a fazer aniversário de novo. 


07 de julho de 2021

Rafael Vasconcellos 

Rafael é carioca, clínico em eterna formação, ex-tenor no “SVAC” e mestrando em psicologia pela UFRJ. Filósofo de botequim e sofredor pelo Botafogo, escreve como hobby para ajudar a respirar. Acredita que na escrita de ficção como uma arma poderosíssima de comunicação que deveria ter mais espaço nos ambientes acadêmicos.

 (Arte: Álan Batista) 

Assisti esses dias um filme que até então tinha passado completamente por fora do meu radar: O Orfanato, produzido por Guillermo del Toro. O filme espanhol de 2007, sem dúvida encaixado no gênero de terror, ousa mais do que se acomoda.


Acontece que, em geral, filmes de terror tendem a se prender no cômodo, ou seja, em clichês narrativos e estruturais (vide o famoso “sustinho” após um momento de breve silêncio) - e esse filme usa disso para inverter de forma brilhante a nossa perspectiva sobre o que está sendo contado.


É o tipo de filme que é difícil de vender aos amigos: “Cara, você TEM DE ver esse filme!”, “Por quê?”, “Não posso falar!” – quem nunca passou por esse diálogo?


Fato é: filmes de terror que usam do fato do gênero normalmente se levar mais a sério do que realmente é para mudar nossa perspectiva sobre uma história ou um assunto são, sem dúvida, os melhores (como no caso dos já clássicos “Corra!” e “Parasita”).


Longe de ser uma resenha ou crítica aprofundada, fica aqui a dica de um filme que faz uma das inversões de gênero cinematográfico mais interessantes que vi nos últimos tempos.





07 de julho de 2021

Rafael Vasconcellos 

Rafael é carioca, clínico em eterna formação, ex-tenor no “SVAC” e mestrando em psicologia pela UFRJ. Filósofo de botequim e sofredor pelo Botafogo, escreve como hobby para ajudar a respirar. Acredita que na escrita de ficção como uma arma poderosíssima de comunicação que deveria ter mais espaço nos ambientes acadêmicos.


As produções apresentadas a seguir são criações-fruto da disciplina eletiva - para estudantes da graduação em Psicologia - e livre escolha - para outros cursos - “Educação, Saúde e Trabalho Interprofissional”. Ministrada no período letivo remoto 2020.1 pelas professoras Cristal Oliveira Moniz - IP/UFRJ - e Tatiana Clarkson Mattos - IESC/UFRJ, e os professores Thiago Melicio - IP/UFRJ e André Bocchetti - Faculdade de Educação/UFRJ.


Sobre a disciplina: 


“O curso, de caráter reflexivo, vivencial e propositivo, discutiu a formação e as práticas interprofissionais na interface entre educação e saúde. Nesse sentido trabalhou a abrangência conceitual da EIP, seu histórico internacional e nacional integrado à implementação do SUS, em especial na Atenção primária à saúde. O curso foi ministrado por docentes das áreas de Educação, Psicologia, Odontologia, Enfermagem, Saúde Coletiva e Medicina. Contou também com a participação de trabalhadoras/es da rede de saúde.”


Apresentamos ao longo de três publicações algumas das criações que a estudante de Psicologia Bruna Bizarro realizou no decorrer da disciplina e seu relato - transcrito na íntegra - sobre esse percurso em meio ao período remoto.


Sobre os percursos de criação a partir dos disparadores “corpo, grupo e carnaval”


“Por último o carnaval, que justamente não teve esse ano, porque também muito difícil festejar qualquer coisa esse ano, mas também o carnaval não é só festa, acho que o carnaval é quase um luto, em certos momentos, coletivo, e esse ano foi de fato, a gente nem saiu e nem brincou porque muitas pessoas perderam suas vidas e vão perder, e quando falo de vida não to falando de perder o corpo, mas perder a vida de outra forma, né? Até como o João falou o conceito do Luis de Desencantar, acho que tá todo mundo nesse processo de desencanto, tentando não cair totalmente no desencanto, mas muito difícil e acho que essas produções nessas disciplinas, e na arte mesmo não só da gente produzir, mas da gente admirar, e estar, e assistir, e ouvir, ela é o que tá fazendo a gente não cair totalmente no desencanto porque se não fosse isso, sinceramente eu não sei.


E aí por último teve os vídeos, que eu também tinha a ideia na cabeça, não saíram iguais ao que estava pensando, mas fiquei bastante satisfeita com meus vídeos. Eu queria na verdade ter gravado. A gente queria fazer que cada um gravasse a sua rua, naqueles vídeos que as pessoas narram. Eu queria ter gravado a minha rua, as meninas gravado as ruas, falei com elas até, mas a gente chegou à conclusão que isso era muito impossível de fazer por conta da violência. E aí eu achei no youtube esse vídeo do centro da cidade deserto. Queria fazer esse contraste com o carnaval, que é justamente quando a gente toma essas ruas, e as ruas que definitivamente não são nossas assim, né? Nossas que eu digo, a maioria das pessoas, sei lá, eu por exemplo passei a ir na zona sul quando passei na faculdade, eu nunca tinha frequentado a zona sul, que é muito longe da minha casa, não faz sentido, e também de me sentir à vontade nesse lugar. Menos no carnaval, o carnaval é o momento que a gente está ali, no centro, e bem, está camuflado naquela multidão.


As vozes, o texto também eu tinha uma ideia e tive que fazer uma pequena pesquisa assim, com uns fragmentos, porque o texto são fragmentos e eu queria pôr vozes diferentes, então eu saí pedindo pra várias pessoas, e foi estranho essa recepção delas, sei lá “porque eu vou gravar isso?”, “O que você vai fazer isso?” E também eu tive um estranhamento de pedir pra elas para fazer isso, cara, uma coisa tão simples, né? Pedir para uma pessoa gravar um áudio, mas falando do corpo, e isso pode ter sentidos muito diferentes pra cada pessoa né? Mas foi muito interessante, e o resultado me deixou feliz, eu acho que eu poderia ter feito horas daquilo ali, horas... a gente não precisa dar limite pra falar disso, porque o corpo não é isso que é físico, é outra coisa, que a gente vê uma parte dele, mas tem os outros corpos também, tem os encontros com os outros corpos que eu nem cheguei a comentar nessa montagem de fragmentos que eu fiz.”



Vídeo “Corpo por eles” (23/02/2021)


“O segundo é um texto escrito e falado por mim e um vídeo que produzi mostrando esse contraste das máscaras e dos corpos, antes e depois da pandemia. Mas que também não se restringe a este contexto pandêmico, vide que o corpo adoece por diversas razões como, por exemplo, o neoliberalismo.”


“(...) a verdade era pra ser um vídeo só, o vídeo com as ruas vazias e o carnaval era pra ser, como vou explicar? A parte de trás, e na frente eu ia botar um quadrado com as bordas redondas com outro vídeo, que é o vídeo que aparece como se eu fosse fazer uma máscara de carnaval e aí eu boto uma máscara de pano, de covid, só que quando montei ficou muita informação, muito ruim, e eu tirei, eu fiz dois vídeos, e resolvi escrever um pequeno texto com as ressonâncias que eu tava tendo na hora, fiquei satisfeita, mas eu dei minha voz, então não gostei muito, minha dicção é ruim, mas eu gostei do texto, achei que deu pra expressar o que estava sentindo, que era essa falta de contato com as outras pessoas, com esses espaços de convivência, e isso tinha que ir pra algum lugar né? E saíram nessas artes, que eram trabalhos de disciplinas, mas pra mim foram muito mais que isso, e não só pra essa disciplina, você perguntou sobre outra disciplina e foi a disciplina do João, não sei se ele vai lembrar, mas tipo, o meu diário de ressonâncias foi gigante, e agora que passou eu posso falar, que eu fiz 99%, tipo as meninas ajudaram, fizeram uma página, sei lá, mas gigante, o meu diário de ressonância da disciplina do João deu 64 ou 63 páginas, por ai, sabe? Porque eu me empolguei, sabe? Eu falei “cara, eu quero que isso aqui…” não sei, eu gostei de fazer aquilo ali, porque estava sendo uma válvula de escape.”



Vídeo “Corpo por mim” (23/02/2021)



“Esse corpo não é meu, um dia foi. Em todos os lugares ele está, no nosso corpo, onda é sinônimo de inundação. Ninguém se afoga. Monstruoso e disforme. Sem corpo, não há vida.


Em dia de festa, o corpo se suja e todos os dedos se quebram só para curar de novo.


Corpo de rua, corpo de praia, corpo de tortura, corpo de defunto. Todo corpo é nosso e tudo nosso é corpo.


O corpo doente e o corpo que mata são um só, mas o corpo que festeja e que se fantasia, não.


O corpo de carnaval não é meu, nunca foi.


Nosso corpo é território de dor, a festa é só evento." 


                                                                                                                                             Bruna Bizarro




Entrevista realizada por: Carolina Alves


Sobre a autora: “Meu nome é Bruna, tenho 22 anos, moro no Rio de Janeiro e curso psicologia (8º período) na UFRJ.” Bruna Bizarro | @bruna.bizarro e @b_perfida


Postagens mais recentes Postagens mais antigas Página inicial

Fragmentos Publicados

  • ▼  2021 (43)
    • ►  abril 2021 (2)
    • ►  maio 2021 (7)
    • ►  junho 2021 (11)
    • ▼  julho 2021 (6)
      • “Em busca de saúde: delírios pandêmicos” - Parte 3
      • O Orfanato - Rafael Vasconcellos
      • Dançando ao som do fim do mundo - Rafael Vasconcellos
      • Biologia sociológica ou sociologia biológica - Raf...
      • Quando crescer eu vou ser criança - Rafael Vasconc...
      • Entrevista com estudantes - Jéssica Peixoto
    • ►  agosto 2021 (7)
    • ►  setembro 2021 (7)
    • ►  outubro 2021 (3)
  • ►  2022 (13)
    • ►  maio 2022 (1)
    • ►  junho 2022 (1)
    • ►  julho 2022 (1)
    • ►  agosto 2022 (3)
    • ►  outubro 2022 (1)
    • ►  novembro 2022 (2)
    • ►  dezembro 2022 (4)

Temas

Colagem Digital Coluna Criação Criação Coletiva Eleições Entrevistas Fragmentos Pandêmicos 2021 Homenagem LGBTI+ Música Parcerias na UFRJ Poema Poesia Política Poéticas Políticas das Emergências Prosa Psicologia Universidade Vídeo estÉTICAs Ética Profissional

Integrantes da Revista

  • Carolina Alves (1)
  • Felippe Del Bosco (3)
  • Flora Dias (4)
  • Isabela Diógenes (2)
  • Manuela Bissoli (1)
  • Marcus Alencar (1)
  • Rafi Nobrega (2)
  • Tiago Castro (1)

Contato

Nome

E-mail *

Mensagem *

Tecnologia do Blogger.

Colaboradores Externos

Rafael Vasconcellos Gabi Neves Adriana Herz Domingues Autoria anônima Bruna Mello Bruno Sobral Gabriela Castro Gilson Secundino Henrique Maluf Luany Menezes Lucas Bourdette Lucas Correia Mariana Nolding Mônica Andréa Paulo Gama Sol Diamand Suzana Massa Álan Belém

Copyright © Revista Fragmentos | Núcleo Trabalho Vivo | Instituto de Psicologia | UFRJ

Kinsley Theme. Desenvolvido por OddThemes

↟